30 de abr. de 2014

RAMALHETES DE OUTONO

As tímidas flores do outono
Fecundam com o amor do verão
Mas gestam na primavera
Quando irão nascer nos jardins sem donos
Aqui, acolá...
Até dentro de um bom coração

Há ramalhetes de esperança sob as folhas
Que caem sem ofender estas sementinhas
Parece que Deus as quer só para Si
Sem nossa mão ou escolha
Envia anjos para as colorir...
Tirando até a vontade das avinhas

Os bancos que estão na praça
Almofadados de folhas coloridas
Esperam um ser apaixonado
Que lhe desperte todas as graças
Ah, a moça do ombro amorenado...
Lá se vão as florinhas das avenidas

Tenha calma, vento impetuoso, devasso!
Estás a tirar as vestes da Terra
Aqui neste outono
Há criaturas de todos os compassos
Frágeis, e até amenas...
Seja só aragem, não provoque guerra

As flores do outono são tímidas
Pequenas como o pio da ave no frio
Transformam-se em ramalhetes nas auroras
Pois para elas nada mais prima
Além do despudor do galho...
Nu, na árvore, as protege com seu brio.

29 de abr. de 2014

MAESTRO

Quero uma música pequena e infinita.
tão calorosa, tão erudita...
Componha, então, para mim, Criador,
uma canção para o dia chamar a noite,
para a nuvem entregar a chuva,
para lavar  toda desdita.

O tempo, o pranto e as notas não lamentam,
são amores e fugas que se sustentam,
sob um acordo sinfônico
da música que quero dançar sobre as pedras..
Escreva uma música cálida e magnífica,
com frases apaixonadas que não se inventam.

O maestro fugiu com a louca batuta
me pondo calada sobre a conduta.
Escreva logo, depressa, esta música,
não quero um favor, quero um fardo de sonhos,
necessito um punhado de eternidades,
para esconder n'alma minha parte maluca.

Quantas vezes escuto só sussurros desta canção!
E a criastes só para meu coração.
Quero alcançar cada vontade sem desgosto.
Até pode ser perto do horizonte,
a fronteira que me aguarda sem partidas
nesta orquestra de solo de violão.


28 de abr. de 2014

POEMINHA

Todo sonho é leve
é alvo,
cândido, risonho e fingido.
Baila como cavaleiro amante,
abandona a dama como ladrão coagido.
Ora que poesia?
É uma saudade!
No regaço lírico e enfadonho,
onde o pranto, de imenso, é duvidoso,
faz sorrir a dor, e deixa nu todo o sonho.
Inspiram as estações
os poemas,
que o homem soluciona calado,
sempre que o vento retorna do tempo,
e traz um verso, num coração orvalhado.

24 de abr. de 2014

GUERRA

Vi horizontes caídos
Sem repousos livres,
Mas da indolência inóspita
Receei...
É assim,
A guerra.

Deitavam o sol desmaiado
Sobre o leito do zênite,
Não mais havia lugar leal
Nem estrelas...
Eu via assim,
A guerra.

Vigentes leis sem reputação
Dada aos leigos em triunfo,
Mas todo caldo em labuta lega
Um espaço dorido...
Presenciei ainda,
A guerra.

Quando o arauto comandante
Feriu a ira dos obscenos,
Vi risos destronados destros,
Mas negros...
E surgia,
A guerra.

Agora sem sol, sem horizontes,
Em cada alma um campo minado
A farejar toda felicidade farpa,
De destino vil...
E as estrelas,
Todas frias,
Na guerra.


23 de abr. de 2014

MARIA DE TODAS AS SANTAS

Maria estava sem graça, e com desgraça latente e palpitante.
Desígnio, pensou Maria, mal feito, é coisa de estreante,
Um motejo, coisa de ‘Deus quem quis’.
Ah, mas isto não é cabível, deve ser um mal esquizofrênico.
Acreditou até que fosse algo raro, algo endêmico,
Algo como o ditado, ‘ver pra crer’.

Maria confessou ao padre e a Deus, mas era inglória, a vadia.
É a cruz, pensou Maria, é destino, coisa daquele dia,
Quiçá foi um engano, ‘diz-me com quem andas...’
Ah, que infortúnio, deve ser mal crônico, hereditário.
Um deslize, coisa frouxa, mas digno de comentário,
Por assim dizer, ‘hoje é tão comum.’

Maria, toda afetada, exibia à laia seu porte donzel.
Espúrios, pensou Maria, querem meu nome no fel
É um contraste de ilusões, ‘contar estrelas...’
Ah, isso é inanição da alma, é uma aberração,
Foram uns minutos sem gosto nenhum, e agora essa apelidação.
Que se diga, ‘a Maria vai c’asotras’!

Maria, na sua aflição, não é trouxa nem assombrada.
Inventice, pensou Maria, coisa de mulher desgarrada.
Pode ainda acontecer esses ‘casos de milagres...’
Ah, isso não tira sono, é só suspeita, é teimosia,
Mas sentir esse garrote no peito é uma agonia.
Então no frenético raciocínio, ‘o que foi será...’

Maria sentiu-se roliça na sua vaidade de mulher moça.
É desatino, pensou Maria, a vida é que é insossa.
Preferível é cantar, que se vá ‘ao Deus dará’         
Ah, isso é degradante, todo suplício nada adiantou,
Pose desnecessária, a Maria engravidou.
Que se diga agora, ‘quem planta colhe...’.

22 de abr. de 2014

LONGA JORNADA

Como é difícil saber das distâncias,
que as dores escolhem percorrer,
ou onde as saudades estão guardadas!
Quase impossível não conter
um pranto que lembra o passado,
que vai passando
garboso pra nosso espanto,
e vamos ficando
com tanta esperança,
sob tanta vida de abundâncias,
que pouco importa andar mais um pouco.

 A juventude é uma fraqueza tenaz,
uma peripécia desacreditada.
Um esconderijo melífluo de lágrimas e risos,
d'uma alma quase desabitada.
Tanto faz sonhar, tanto faz correr.
Sempre estaremos correndo,
para juntar universos em retalhos,
ignorando o que o destino está prevendo
em cada bocado de ilusão,
num coração pertinaz,
inundado de futuros gigantes.

Como é difícil crescer sem o horizonte,
que nasce  tão perto da jornada!
Como labutamos para encontrar sua trilha
em nossa curta e densa morada!
E um dia o silêncio começa a encantar
o caos que outrora fora desencanto.
Nada resta, a não ser crescer.
Cativar a sabedoria sem virar santo.
Seguir, seguir... É tanto, e pouco se sabe!
Começar a atravessar a ponte,
para recolher todas as jornadas.


21 de abr. de 2014

MINHA ÁRVORE DE COLIBRIS

Quando em sonho
A mortalha do medo aparece
Parece não surgir novos dias
É assim que me ponho
A escutar nostalgias

É quando o tempo
Oculta toda a insensatez
Insensato o devaneio aparece
Como um amor de antanho
E minh’alma, então envaidece

A madrugada traz floradas
Pois que a nudez é noite
Anoitecendo todo querer
Há colibris e passaradas
Em minha árvore sem eu merecer

Qualquer dia é mansidão
Para tanto questionamento
Questiono aos colibris
Esqueço a solidão
Nas auroras de frenesis

Quando o sol apaga tristonho
Os hinos adormecem
Dorme a árvore calada no espaço
E assim eu apanho
Um deus em meu regaço


18 de abr. de 2014

TRAÇOS

O sonho tem a ideia que voa
Por onde a esperança mais anda,
E se o riso, o pranto destoa
A felicidade, o espetáculo comanda

Não é à toa que se vive de tempo,
Juntando intervalos e espaços
Enquanto planeja-se algum invento,
Os caminhos podem ser curvos ou só traços.

E quanto mais o pranto avança
Mais límpidas as armas da guerra,
Assim, lava-se a face da criança
Com a lágrima que caiu na terra.

Ainda há que se andar com apoios,
Porque os olhos não veem o passado
Hoje, o futuro são pedras de arroios
Que só a alma conhece o traçado.

17 de abr. de 2014

PALCO

Inquietação de um socorro desajeitado
Que perdido numa beleza impossível
Visita o ego nu, e descortinado
Ah, sou um palco inconformado!
Tudo vislumbro
Pouco vejo...

Devanear qual animal livre e selvagem
Assolando a alma de um passado
Criando afago numa miragem
Quando a cortina cai é mensagem
Não sou o aplauso
Nem o apupo...

O silêncio finaliza toda inquieta trama
Caem-me os panos, os meus ultrajes
Toda vida que enfeito é um drama
Discurso só para quem diz que ama
Então apago a luz
Que não encontrei...

Pensamento que foge, rasteja, sem graça
Nesta inquietação daninha e desafinada
Noite numa taça moteja, que desgraça!
Coloquei no coração uma mordaça
No escuro
Perdi o medo...

16 de abr. de 2014

INVOCAÇÃO

Vou acompanhar-te em qualquer tempo
Fazendo-me passar por paisagem triste,
E da tristeza, então, pranto sempre lento.

Qualquer sina que desfaça este destino,
Ei de jurar-te a lentidão das eras.
Afigurar-me guerreira pudica
Só para colher tuas mãos.

Se minha guerra perder o rumo,
Encontrar-me-ás desarmada e fraca
E na fraqueza, desgraçada, sem prumo.

Tais queixumes usurparão dádivas
Aos meigos ignorantes,
E de tanto gritar esperanças
Faltar-me-á a força da lucidez.

Toda luz furtarei de escuridões eternas,
Ocultarei cada facho em nichos de meu olhar,
E olhando toda dor, em mim, não serão nada ternas.

Ai se encontrar-te em qualquer caminho,
Pedirei vingança à sabedoria,
Agora que perdi toda luxúria
Vem anunciar-te alquebrado!

Vou debruçar-me sobre o vento,
Equilibrar minha ira com tua ironia
Piedade. Ironizo assim, meu tormento.



15 de abr. de 2014

UM SER OPORTUNO

Viajei sem sina e desamparada
Fiz voto e fiz foto bem resumidos
Cultivei festas como desvairada
Foi quando eu era menina
Criatura sem tempero
Que cantava cantos coloridos
Permeando o sal e o doce
Do passado
Foi como um sossego sussurrante
Não foi tanta felicidade
Nem foi tanta a tragédia
Foi somente um ego arrogante

Fogosa liberdade egoísta
Transborda mãos e ideias vãs
Da ânsia de abraçar o mundo
Ganhei um ósculo como identidade
Sentindo a colheita ainda em brotos
Olho a mesa que está posta
Sobre um aras ainda incompleto
O presente
Agoniza em mim
Nem tanta esperança
Nem tanta alegoria
Porque sei que tem fim

Com toda calma desfeita
Preencho o canto deste encanto
E choro deslumbrada
Quando chega em minh'alma
As venturas celeradas e diáfanas
Que se ocultam crédulas
No íntimo que sonha infinitos
O futuro
Vagueia no meu céu noturno
Nem tão divino
Nem tão maléfico
Um ser oportuno.

14 de abr. de 2014

RAÇA

Raça é coragem
É dom divino
Quem maltrata
Não tem idoneidade
Nem honestidade

Vive de malandragem
Não se apieda de seus filhos
Nem possui amor próprio
Quer exibir casta
Mas só possui suja casca

Raça é coração
É amor universal
Quem maltrata
Não tem sensibilidade
Nem virilidade

Querem ser espertos
Às custa dos inocentes
Lucrar pelas mãos de Deus
Maculando sua palma
E negociando assim, sua alma.

12 de abr. de 2014

O INÉDITO E O TEMPO

Inédito é o tempo, que surge entre o tempo, o espaço e o vácuo.
É um tempo que não passa, passou e está passando...
Inédito é o filho, que vai nascer com o nascimento,
É com o filho que nasce o tempo que não vai passar do tempo.
Inédito é o pai, que vai ser pai depois de filho,
E vai ser novo, e vai ser bobo, porque vai passar o tempo.

Inédita é a mãe, que vai nascer novamente ocupando o espaço do tempo.
Vai embalar o tempo, na madrugada embrulhado em fraldas...
Inédita é a paciência, que chega sempre atrasada,
Trazendo um tempo que fede a mofo, bolor dos ineditismos.
Inédita é a idade, de tão nova, brilha de esperanças.
Sempre faz a balança pender para o lado do mesmo tempo.

Inédito é um novo dia, porque ele chega nu e limpo,
Bate na janela com cinismo se achando o dono do tempo.
Inédito é o perdão, que o pecador não vai perdoar,
Vai deixar a cura para o tempo, porque só ele é argumento.
Inédito é o solo, nunca é o mesmo para os mesmos pés,
Mas os pés voam sem tempo, para um tempo que chamam de futuro.

Inédita é a serena calma das portas que se abrem ao amanhecer,
Porque ela só traz o tempo, mas questiona a boa vontade.
Inédita é palavra que invade a boca do inocente,
Que aflora com risos, na dúvida patética do tempo.
Inédita é a vergonha que se oculta na pressa,
Deixa passar em branco a vida, por falta de tempo.

Inédito é o homem, que transforma seu lar como exemplo de Pátria,
E com o tempo faz da Pátria seu lar como merecimento.
Inédito é o amigo, que estende a mão até no escuro,
Não faz do tempo um medo, mas da vida um grande tempo.
Inédito é o oculto, que fecha os olhos dos cegos que sabem tudo
Pela sabedoria do além tempo e do saber fecundo.

Inédita é a morte, que chega em dúvida e vai-se em luz,
Traz consigo o trauma do medo de nascer com pouco tempo.
Inédita é a oração, que fecha o dia da realidade,
E sonha um tempo que ora para todo o sempre.
Inédita é a utopia, que se acredita na promessa feita à massa,

Porque da necessidade faz-se crédulos em largo tempo...

11 de abr. de 2014

PARA QUE SAIBAS

Para que saibas,
Não morri.
Vagueio qual colibri,
Para que sintas
Que vivi
O melhor de ti.

Para que ouças
Meus passos,
Bastam meus traços.
Para sentir-me
Através da alva lua,
Já não sonharei nua.

Para que me esqueças,
Finja infidelidade.
Meu ímpeto é de humildade.
Para teus sonhos
Exijo minhas lembranças,
Ímprobas heranças.

Para que saibas,
Não existi.
Em gotas pouco vivi.
Para que vivas,
Deixo-te meu dia
E minh’alma sem avaria.